Sociologia
09/06/2010
Precariedade de cortiços influi no desempenho escolar
Por Júlio BernardesA pesquisa envolveu alunos de duas classes da quarta série do ensino fundamental em uma escola na região do Glicério (Centro de São Paulo). “Além de buscar subsídios para políticas públicas de habitação voltadas aos cortiços e moradias precárias, o trabalho pretende oferecer elementos para políticas pedagógicas direcionadas às crianças de famílias de baixa renda que residem em condições precárias”, conta o engenheiro.
Numa primeira etapa, o estudo avaliou a condição habitacional das crianças. Posteriormente, os resultados foram comparados com o desempenho escolar, em especial com os índices de promoção e reprovação. “A área média das moradias era de 16 metros quadrados, muitas vezes reunindo sala,quarto e cozinha em um único cômodo”, diz Kohara. “Em 81% dos casos, não havia área livre além do corredor de circulação comum a todos os moradores e 73% não tinham janelas acessíveis.” Cada família era composta, em média, por quatro pessoas.
Em 35% dos cortiços, a porta de entrada estava sempre aberta. Quanto às moradias, 41% das famílias não possuíam mesas e cadeiras e 33% não tinham guarda-roupa. O número de camas era inferior ao das pessoas que residiam em 78% das moradias. “Há uma rotatividade muito grande das famílias, 59% residiam no local em que foram entrevistadas há menos de um ano”, afirma o engenheiro. “Isso leva a perdas e dificuldade de conservação do material escolar, havia casos de crianças que moraram em três locais diferentes em seis meses.”
Espaços
Na comparação das condições de moradia com o desempenho das crianças na escola, a pesquisa verificou forte associação entre maior precariedade e índices de reprovação. “Dos alunos que moravam em um cômodo só, 67% foram retidos”, destaca Kohara. “Nenhum dos retidos tinha acesso a espaços livres internos, além do corredor, o que levava essas crianças a ficarem o dia inteiro na rua.” Nos cortiços que mantém a porta de entrada aberta , 56% dos alunos foram reprovados, nível que cai para 24% em cortiços com acesso fechado.
Em todos os casos de reprovação, o número de camas era inferior ao de pessoas na família. “Isso levava algumas crianças a dormirem sobre espumas ou pedaços de papelão, o que prejudica o sono e poderá repercutir em seu desempenho na escola”, explica o pesquisador. “A falta de espaço também cria dificuldades para guardar adequadamente o material escolar, situação que costuma ser desconhecida pelos professores, os quais acabam atribuindo o problema ao descuido dos alunos.”
Kohara defende uma maior articulação das políticas públicas voltadas para a população que reside em cortiços. “A pesquisa verificou que as pessoas tinham acesso a algumas dessas políticas, mas não havia uma ação articulada dos setores de habitação e educação com outras áreas, tais como saúde e atendimento social”, aponta. “Por exemplo, uma ONG presta atendimento a alguns moradores, inclusive com apoio da Prefeitura, mas não possui diálogo com a escola.”
O engenheiro também enfatiza a necessidade de um investimento maciço em políticas de habitação voltadas para a região central da cidade de São Paulo. “Na área educacional, é essencial que os educadores conheçam in loco a realidade dos cortiços”, ressalta. “Esse conhecimento deve servir para construir metodologias pedagógicas que atendam as crianças considerando a realidade delas”. A pesquisa teve orientação da professora Maria Ruth Amaral de Sampaio, da FAU.
Este conteúdo foi publicado em 21/05/2010 no sítio Agência USP de Notícias. Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original da matéria.