Sociologia
06/03/2012
Sob a trama das redes sociais
O advento das redes sociais digitais e a transformação do comportamento da sociedade contemporânea no universo da internet é o tema que a Revista USP discute em sua nova edição, de número 92. Com a participação de especialistas das principais universidades brasileiras, traz um debate sobre a crise do antropomorfismo social, os espaços de subordinação e contestação nas redes e o efeito desse universo em nosso cotidiano.“O tema deste dossiê Redes Sociais já vinha se desenhando desde algum tempo”, observa o editor, Francisco Costa. “Isso pelo simples fato de que é absolutamente impossível imaginar a vida sem o acesso à rede. Essa questão se aplica ainda aos nossos aparelhos celulares, substituídos pelos smartphones. Há alguns anos, era comum ouvir as pessoas comentarem: o que seria de mim sem meu celular?”
Costa lembra que nada do que parece tão premente hoje fez falta ao homem de apenas algumas décadas atrás. Para refletir sobre essa mudança, a Revista USP destaca as tramas das redes sociais.
O artigo que abre a discussão é de Massimo Di Felice, professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e coordenador do Centro de Pesquisa Atopos. “Para entender a profundidade das transformações decorrentes da difusão das redes digitais, é necessário interpretar a lógica reticular a partir não somente de uma perspectiva comunicativa, mas no interior de uma mudança maior que torna possível a compreensão das arquiteturas reticulares como uma ruptura epistêmica que acontece em diversos campos do conhecimento”, observa.
O surgimento das redes digitais, segundo o professor Di Felice, delineia-se como uma oportunidade para uma análise, não apenas sobre a importância do papel da comunicação na nossa sociedade. Importante é considerar as transformações e as dinâmicas de inovação. “A difusão da arquitetura reticular informativa de uma inteligência planetária aponta para a necessidade do repensamento do antropomorfismo social, tornando-se um dos desafios hermenêuticos da nossa época.”
Novas articulações – Giselle Beiguelman, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, aborda as ambivalências das redes sociais como espaços de controle e de potencialização de novas articulações socioculturais. “A multiplicação dos sites de mídias sociais vem produzindo mudanças profundas nas formas de produção e circulação de informações e do conhecimento”, ressalta Giselle. “Os mais conhecidos, como o microblog Twitter, a megarrede de relacionamento Facebook e redes de compartilhamento como o YouTube e Flickr são também grandes conglomerados corporativos e despertam, por isso, restrições por parte de grupos midiativistas.”
Nesse universo tão amplo, os professores Eduardo Marques, do Departamento de Ciência Política da USP, Graziela Castello e Renata M. Bichir, ambas do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), apresentam as redes pessoais em situação de pobreza em doze localidades nas cidades de São Paulo e Salvador, totalizando 362 redes. Os resultados da pesquisa indicam a importância dos tipos de redes e de sociabilidade na explicação das situações de pobreza urbana.
As práticas artísticas em redes sociais virtuais são discutidas por Maria Amélia Bulhões, professora do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “O desenvolvimento internacional da rede internet, com sua utilização generalizada a partir da segunda metade dos anos 90, oferece aos usuários formas individualizadas de percorrer inúmeras vias de informação à sua disposição”, explica. “Os artistas perceberam, desde o início, as possibilidades desse novo meio; as primeiras propostas de produção artística on-line datam de 1994.”
Maria Amélia observa que os artistas dessas obras participam, em geral, de equipes interdisciplinares que mantêm seus próprios sites para alocar seus projetos, ou então, participam de eventos especializados em sua difusão. “Eles entram num campo denominado por muitos de arte da comunicação, que, segundo Fred Forest, se caracteriza por simulação, interatividade e tempo real. Algumas dessas obras também questionam o próprio campo das mídias eletrônicas.”
Para o professor Vinicius Romanini, do Departamento de Comunicações e Artes da ECA, as redes sociais que se autoorganizam pela rede mundial de computadores transformam radicalmente a maneira como a comunicação social acontece, impactando de forma decisiva nas mudanças políticas e sociais em curso no mundo todo.
As Redes Criminais também são abordadas neste dossiê. Fernanda de Almeida Gallo, doutoranda em Ciências Sociais da Unicamp, apresenta uma pesquisa sobre o uso da metodologia de redes na análise de fenômenos sociais e aponta os resultados sobre a CPI do narcotráfico e investigações correlatas da Polícia Federal. “Destacamos a contribuição que tais ferramentas oferecem na elaboração de teorias.”
Facebook no cinema – A partir do filme A Rede Social, de David Fincker, a professora Maria Cristina Castilho Costa, do Departamento de Comunicações e Artes da ECA, analisa o sucesso alcançado pelo Facebook. O seu foco não é a rede como resultado da inteligência e oportunismo de seu fundador, Mark Zuckerberg, mas pela maneira como proporciona aos usuários experiências que convergem com a sociedade contemporânea, marcada pelo neoliberalismo e globalização.
“A pesquisa da sociabilidade on-line” é o tema do artigo assinado por Ana Maria Carneiro, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, e Tom Dwyer, professor do Departamento de Sociologia, ambos da Universidade Estadual de Campinas. “O objetivo do artigo é apresentar a evolução dos estudos sobre a sociabilidade possibilitada pelas tecnologias de informação, desde os estudos pioneiros na década de 1970”, explicam. “Ao longo do tempo, é possível perceber um movimento dos pesquisadores em torno da maior ou menor articulação dos aspectos on-line e off-line dos fenômenos estudados até a integração dos planos tornar-se quase senso comum.”
“Diz-me com quem andas, que te direi quem és” é o título convidativo do artigo do professor Marcelo Kunrath Silva e do mestrando Rui Zanata Júnior, ambos do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “O artigo tem como meta fazer uma apresentação introdutória da metodologia de análise de redes sociais”, esclarecem. “Nesse sentido, aborda as características básicas dessa metodologia e seus fundamentos teórico-epistemológicos, salienta alguns dos empregos mais destacados nas ciências brasileiras e, por fim, apresenta um exemplo de uso da análise de redes sociais na investigação da relação entre homofilia e desigualdade no associativismo.”
Esta reportagem foi publicada em 05/03/2012 no sítio da Agência USP de Notícia.Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor.