Disciplina - Sociologia

Sociologia

06/11/2007

Questão de desigualdade

As más condições de saúde e nutrição relacionadas à desigualdade social não atingem apenas as crianças mais pobres, mas também as que estão na camada intermediária de condições de vida, de acordo com pesquisa realizada na Universidade Federal da Bahia (UFBA).Segundo a coordenadora do estudo, Ana Marlúcia Assis, professora titular do Departamento de Ciência da Nutrição da UFBA, as crianças dos dois segmentos apresentam déficit de crescimento relacionado à carência de proteínas e micronutrientes. O estudo foi publicado na edição de outubro da revista Cadernos de Saúde Pública.
“É importante ressaltar que mesmo a condição de ‘menos pobreza’ não assegura padrão de crescimento linear adequado. Tanto os mais pobres como o grupo intermediário apresentaram desnutrição e anemia”, disse Ana Marlúcia à Agência FAPESP. O estudo avaliou 2.001 crianças menores de 5 anos e seus ambientes familiares em dez municípios de áreas rurais e urbanas da Bahia, considerando aspectos como teto salarial, consumo de alimentos e acesso a serviços de saneamento básico distribuídos entre os tercis (frações de 1/3) dos mais pobres, do grupo intermediário e dos mais ricos.
Foram detectados diferentes graus no padrão de morbidade na infância, caracterizados por altas taxas de doenças infecciosas, parasitárias e carenciais, como desnutrição e anemia.
Segundo Ana Marlúcia, a análise da estrutura socioeconômica das famílias selecionadas apontou as carências nutricionais – principalmente de proteínas e micronutrientes – e a questão espacial das moradias como maiores responsáveis pelos déficits de crescimento entre as crianças dos tercis intermediário e pobre.
“O perfil mais crítico é definido pelas condições de vida das crianças que moram na zona rural, com pouco ou nenhum acesso a saneamento básico, em famílias chefiadas pela mãe – em geral com baixa escolaridade –, com pai desempregado e relação desproporcional entre o espaço domiciliar e o número de moradores”, disse.
O estudo detectou que o déficit linear – a inadequação do peso e da altura em relação à idade –, de caráter leve e moderado, é freqüente entre as crianças do tercil intermediário e entre as mais pobres, quando comparado com aquele do 1/3 das crianças mais ricas. “Mas o gradiente da inadequação era mais elevado para as mais pobres”, disse a professora da UFBA.
O déficit de crescimento linear, segundo ela, expressa a exposição às doenças infecciosas e parasitárias e à escassez alimentar de vitamina A, zinco e ferro, entre outros micronutrientes. Embora seja mais grave entre os mais pobres, problemas de crescimento e anemia foram detectados entre crianças do tercil intermediário nos municípios baianos.
Também foi significativa a desproporção entre peso e idade das crianças analisadas – definida como déficit de crescimento ponderal, normalmente associado à insalubridade do ambiente, ao acesso inadequado em qualidade e quantidade aos alimentos. “Esse problema foi perceptível entre as crianças que dividiam a cama com mais de uma pessoa, dificultando o relaxamento corporal e o desenvolvimento dos tecidos musculares e ósseos”, explicou Ana Marlúcia.
Além disso, o estudo identificou que as crianças do segmento mais pobre tinham chances significantemente mais elevadas de adoecimento nos 15 dias que precederam a entrevista, enquanto as chances de internamento nos últimos 12 meses da data da entrevista eram mais elevadas para as do tercil intermediário.
“Considero que o resultado mais importante desse estudo foi mostrar que as condições de vida, avaliadas em gradientes diferentes, determinam chances diferenciadas para a ocorrência dos eventos associados à saúde e nutrição. Ele mostra o semblante das condições consideradas intermediárias, aquelas que se situam entre os mais ricos e os mais pobres”, afirmou.
Segundo a pesquisadora, seria importante que as diferentes condições de desigualdades fossem levadas em conta no momento de traçar políticas públicas de saúde.
“Uma estratégia que poderia ter impacto na redução dos indicadores negativos em saúde e nutrição pode não surtir o efeito esperado em todas as comunidades assistidas. Isso é particularmente verdadeiro para os pequenos municípios do país, em especial no Nordeste brasileiro”, destacou.

Fonte: Agência FAPESP, 30 de Outubro de 2007
Recomendar esta notícia via e-mail:

Campos com (*) são obrigatórios.